9 – “Amemo-nos uns aos outros e façamos aos outros o que
quereríamos que nos fosse feito”. Toda a religião, toda a moral, se encerram
nestes dois preceitos. Se eles fossem seguidos no mundo, todos seriam
perfeitos. Não haveria ódios, nem ressentimentos. Direi mais ainda: não haveria
pobreza, porque, do supérfluo da mesa de cada rico, quantos pobres seriam
alimentados! E assim não mais se veriam, nos bairros sombrios em que vivi, na
minha última encarnação, pobres mulheres arrastando consigo miseráveis crianças
necessitadas de tudo.
Ricos! Pensai um pouco em tudo isso. Ajudai o mais
possível aos infelizes; daí, para que Deus vos retribua um dia o bem que
houverdes feito: para encontrardes, ao sair de vosso invólucro terrestre, um
cortejo de Espíritos reconhecidos, que vos receberão no limitar de um mundo
mais feliz.
Se pudésseis saber a alegria que provei, ao encontrar no
além aqueles a quem beneficiei, na minha última vida terrena!
Amai, pois, ao vosso próximo; amai-o como a vós mesmos,
pois já sabeis, agora, que o desgraçado que repelis talvez seja um irmão, um
pai, um amigo que afastais para longe. E então, qual não será o vosso
desespero, ao reconhecê-lo depois no Mundo dos Espíritos!
Quero que compreendais bem o que deve ser a caridade
moral, que todos podem praticar, que materialmente nada custa, e que não
obstante é a mais difícil de se por em prática.
A caridade moral consiste em vos suportardes uns aos
outros, o que menos fazeis nesse mundo inferior, em que estais momentaneamente
encarnados. Há um grande mérito, acreditai, em saber calar para que outro mais
tolo possa falar: isso é também uma forma de caridade. Saber fazer-se de surdo,
quando uma palavra irônica escapa de uma boca habituada a caçoar; não ver o
sorriso desdenhoso com que vos recebem pessoas que, muitas vezes erradamente,
se julgam superiores a vós, quando na vida espírita, a única verdadeira, está
às vezes muito abaixo: eis um merecimento que não é de humildade, mas de caridade,
pois não se incomodar com as faltas alheias é caridade moral.
Essa caridade, entretanto, não deve impedir que se
pratique a outra. Pelo contrário: pensai, sobretudo, que não deveis desprezar o
vosso semelhante; lembrai-vos de tudo o que vos tenho dito; é necessário
lembrar, incessantemente, que o pobre repelido talvez seja um Espírito que vos
foi caro, e que momentaneamente se encontra numa posição inferior à vossa.
Reencontrei um dos pobres do vosso mundo a quem pude, por felicidade, beneficiar
algumas vezes, e ao qual tenho agora de pedir, por minha vez.
Recordai-vos de que Jesus disse que somos todos irmãos, e
pensai sempre nisso, antes de repelirdes o leproso ou o mendigo. Adeus! Pensai
naqueles que sofrem, e orai.
UM ESPÍRITO PROTETOR - Lyon, 1860
10 – Meus amigos, tenho ouvido muitos de vós dizerem:
Como posso fazer a caridade, se quase sempre não tenho sequer o necessário?
A caridade, meus amigos, se faz de muitas maneiras.
Podeis fazê-la em pensamento, em palavras e em ações. Em pensamentos, orando
pelos pobres abandonados, que morreram sem terem sequer vivido; uma prece de
coração os alivia. Em palavras: dirigindo aos vossos companheiros alguns bons
conselhos. Dizei aos homens amargurados pelo desespero e pelas privações, que
blasfemam do nome do Altíssimo: “Eu era como vos; eu sofria, sentia-me infeliz,
mas acreditei no Espiritismo e, vede agora sou feliz!” Aos anciãos que vos
disseram: “É inútil; estou no fim da vida; morrerei como vivi”, respondei: “A
justiça de Deus é igual para todos; lembrai-vos dos trabalhadores da última
hora!” Às crianças que, já viciadas pelas más companhias, perdem-se nos
caminhos do mundo, prestes a sucumbir às suas tentações, dizei: “Deus vos vê,
meus caros pequenos!”, e não temais repetir freqüentemente essas doces
palavras, que acabarão por germinar nas suas jovens inteligências, e em lugar
de pequenos vagabundos, fareis delas verdadeiros homens. Essa é também uma
forma de caridade.
Muitos de vós dizeis ainda: “Oh! somos tão numerosos na
terra, que Deus não pode ver-nos a todos!” Escutai bem isso, meus amigos:
quando estais no alto de uma montanha, vosso olhar não abarca os bilhões de
grãos de areia que a cobrem? Pois bem: Deus vos vê da mesma maneira; e Ele vos
deixa o vosso livre arbítrio, como também deixais esses grãos de areia ao sabor
do vento que os dispersas. Com a diferença que Deus, na sua infinita
misericórdia, pôs no fundo do vosso coração uma sentinela vigilante, que se
chama consciência. Ouvi-a, que ela vos dará bons conselhos. Por vezes,
conseguis entorpecê-la, opondo-lhe o espírito do mal, e então ela se cala. Mas
ficai seguros de que a pobre relegada se fará ouvir, tão logo a deixardes
perceber a sombra do remorso. Ouvi-a, interrogai-a, e freqüentemente sereis
consolados pelos seus conselhos.
Meus amigos, a cada novo regimento o general entrega uma
bandeira. Eu vos dou esta máxima do Cristo: “Amai-vos uns aos outros”. Praticai
essa máxima: reunir-vos todos em torno dessa bandeira, e dela recebereis a
felicidade e a consolação.
TEXTOS DE APOIO
SANTA CARIDADE
Estende as próprias mãos
Entregando o tesouro que ajuntaste
Ou rogando a migalha
Dos tesouros alheios...
Repara, todavia,
As mãos abnegadas
Que constroem a vida...
Mãos que sangram no campo,
Na condução do arado;
Mãos erguidas na escola,
Em louvor da cultura;
Mãos feridas na industria
Exaltando o conforto;
Mãos que afagam doentes,
Renovando a alegria...
Mãos que servem a mesa,
Enriquecendo o pão;
Mãos nervosas e firmes
Nos volantes bulhentos
Ajustando as artérias
Do progresso incessante.
Mãos que erguem a enxada,
Mãos que empunham a pena...
Mãos que fiam,
Que agasalham,
Que abençoam,
Que consolam...
Assim, pois,
Na graça da fortuna
Ou na dor da carência
Escuta a melodia
Das mãos entrelaçadas
Na oficina do mundo.
E traze com valor
As tuas mãos também,
Cedendo de ti mesmo,
Em suor e esperança,
Ao serviço de todos,
E entenderás, por fim,
Que o trabalho do bem
É a Santa Caridade
Que verte sobre nós
Do Eterno Amor de Deus.
Rodrigues de Abreu - Do Livro Através do Tempo de
Francisco Cândido Xavier
COMECEMOS DE NÓS MESMOS
Ensina a caridade, dando aos outros algo de ti mesmo, em
forma de trabalho e carinho e aqueles que te seguem os passos virão ao teu
encontro oferecendo ao bem quanto possuem.
Difunde a humildade, buscando a Vontade Divina com
esquecimento de teus caprichos humanos e os companheiros de ideal, fortalecidos
por teu exemplo, ou vidarão a si mesmos, calando as manifestações de vaidade e
de orgulho.
Propaga a fé, suportando os revezes de teu próprio
caminho, com valor moral e fortaleza infatigável e quem te observa crescerá em
otimismo e confiança.
Semeia a paciência, tolerando construtivamente os que se
fazem instrumentos de tua dor no mundo, auxiliando sem desânimo e amparando sem
reclamar, e os irmãos que te buscam mobilizarão os impulsos de revolta que os
fustigam, na luta de cada dia, transformando-a em serena compreensão.
Planta a bondade, cultivando com todos a tolerância e
gentileza e os teus associados de ideal encontrarão contigo a necessária
inspiração para o esforço de extinção da maldade.
Estende as noções do serviço e da responsabilidade,
agindo incessantemente na religião do dever cumprido e os amigos do teu círculo
pessoal envergonhar-se-ão da ociosidade.
As boas obras começam de nós mesmos.
Educaremos, educando-nos.
Não faremos a renovação de paisagem de nossa vida, sem
renovar-nos.
Somos arquitetos de nossa própria estrada e seremos
conhecidos pela influência que projetamos naqueles que nos cercam.
Que o Espírito de Cristo nos infunda a decisão de
realizar o auto aprimoramento, para que nos façamos intérpretes do Espírito do
Cristo.
A caridade que salvará o mundo há de regenerar-nos
primeiramente.
Sigamos ao encontro do Mestre, amando, aprendendo e
servindo e o Mestre, hoje ou amanhã, virá ao nosso encontro, premiando-nos a
perseverança com a luz da ressurreição.
André Luiz - LIVRO: APOSTILAS DA VIDA - PSICOGRAFIA CHICO
XAVIER
SENTIMENTOS:
NOSSOS VERDADEIROS GUIAS
"A caridade moral consiste em se suportarem umas às
outras as criaturas e é o que menos fazeis nesse mundo inferior, onde vos
achais por agora, encarnados." O ESE, capítulo XIII, ítem 9.
A comunidade espírita é merecidamente reconhecida pela
sociedade como exemplo de beneficência pública.
A caridade é, sem dúvida, a essência das idéias
espíritas, porque constitui a didática da vida no processo de educação do homem
em busca de seu ajustamento com a Lei Natural.
Importa-nos observar que, mesmo no clima da bondade de
nossas fileiras de serviço, as iniciativas erguidas em nome do amor, muitas
vezes, devido ao arraigado sentimento de egoísmo, podem obedecer a motivações
de natureza individualista.
Joio e trigo convivem juntos nas movimentações sociais de
benemerência e amparo. Interesse pessoal e altruísmo, assim como a luz e a
treva, alternam-se na natureza íntima de nossos sentimentos, mesmo quando
agimos nas edificações em favor do próximo.
Ante esse quadro inevitável do coração, será oportuna a
indagação: como a caridade tem educado a mim mesmo? Em que aspectos tenho
melhorado a partir da ação social? Reconheço os traços de personalismo na minha
atividade de amparo? O bem será bom para quem o recebe; será que está sendo
também para mim que o faço? Como? Quais são os sentimentos experimentados com a
atividade do bem?
A reciclagem do conceito de caridade em nosso abençoado
movimento carece de um enfoque sobre convivência. Mais valor ao relacionamento
humano e menos prática formalizada. A prática é significativa por seu caráter
disciplinador. Acima dela, deve estar a interação humana, a quebra de barreiras
que nos desaproximam do próximo, de sua singularidade rica de lições, que podem
ser absorvidas em regime de salutar intercâmbio de vivências.
Vigiemos o encantamento com o volume de recursos
amealhados nas campanhas de amor. Atentemos para os sentimentos de presunção em
razão das paredes erguidas no acolhimento alheio. Nem sempre tais iniciativas
louváveis são suficientes para o despertamento da legítima cidadania no
coração. Tenhamos cautela com nossas velhas ilusões !
Ao erguermos casas de amor ao próximo, costumamos,
simultaneamente, adotar um processo psicológico de caridade com limites,
restringindo o conceito de próximo aos que se beneficiam diretamente das
iniciativas que promovemos. Saindo dos locais de caridade, muitos corações
amantes do bem, tomados pela incoerência, dispensam tratamentos ríspidos a
serviçais e familiares no lar ou ainda a funcionários e conhecidos no dia a
dia. É a caridade com hora marcada! Atitude ainda distante do movimento sublime
da alma na semeadura do bem sem condições - a aplicação da cidadania como dever
universal de solidariedade.
A cidadania à luz da imortalidade significa a luta íntima
na consolidação dos deveres perante a consciência. Batalhamos pela cidadania de
nosso semelhante e igualmente devemos talhar nas nossas atitudes os sentimentos
que nos identifiquem como cidadãos com participação social consciente, onde
quer que estejamos. Haverá diferença entre o próximo que é beneficiado por nós
nas atividades doutrinárias e aquele que conduz um veículo ao nosso lado,
credor de nosso respeito no ato de trafegar com paciência? Será que o condutor
ao lado de teu veículo não estará mendigando um gesto de gentileza?
Cidadania à luz do ser imortal é educar. E educar-se para
viver com proveito a grande oportunidade reencarnatória. Essa a meta primordial
da caridade com Jesus nos roteiros da doutrina espírita.
Centros espíritas, enquanto células dinamizadoras da
mensagem do Cristo, preparem seus trabalhadores para aprender a conviver, a fim
de não supervalorizarem técnicas e métodos que podem ritualizar as práticas e
desdenhar o acolhimento humano espontâneo e educativo.
Jesus é o exemplo de espontaneidade e ternura no
atendimento do ser humano integral. Essa deve ser a nossa meta, mesmo nos
valendo de métodos ou regimes disciplinares para amar. Mais do que sistematizar
ações sociais, cultivemos a arte de melhorar nossos hábitos no relacionamento,
transformando a casa espírita em um oásis de refazimento e esperança aos
corações desolados e aos cérebros sem norte. Ao implantar práticas de
acolhimento e recepção sem aprender a conviver, corre-se o risco da
formalização de novas filantropias atualizadas pelos conhecimentos, mas não
aperfeiçoadas pela doação íntima de si mesmos.
A única atitude que nos leva ao encontro da consciência é
aquela da qual nossos sentimentos fazem parte. Algumas posturas, entretanto,
são movimentos do ego, que nos inclinam a pensar caridade, um treino que nos
permitirá, pouco a pouco, escapar das armadilhas do egoísmo. Essa a razão de
inúmeras e graves desilusões na vida espiritual entre coidealistas que deram
coisas e não se deram ou se abriram para a vida em abundante dinamismo de
sentir o valor do bem a cada passo, para o outro e para si, no encontro do Self
glorioso.
E lei universal: o que damos, temos. Quando damos o que
detemos, apenas agimos no dever. Quando damos do que é nosso, inserimo-nos no
amor.
Avaliemos nossas modestas ações nos rumos da carida¬de.
Será oportuno pensar e repensar em quais parâmetros se enquadram os esforços
que fazemos pelo bem alheio. Predomina entre nós a cultura de que o bem
expandido, em qualquer forma que se apresente, é apólice de garantia de paz
além-túmulo, aguardando os louros das bênçãos que semeamos. Nem sempre! Nem
sempre!
Não existe bem que não seja bom, o que não significa
libertação definitiva do mal e consolidação de virtudes na intimidade.
A relação de amor com o próximo é a escola bendita para
intermináveis viagens interiores.
A caridade é luz que se acende ao próximo, com a qual,
igualmente, deveremos aprender a nos beneficiar no próprio ato de exercê-la.
Portanto, a paz esperada para além das fronteiras da desencarnação precisa ser
fruída no agora, enquanto semeamos, porque senão podemos estar padecendo da
"síndrome de além-túmulo", isto é, cultuando um futuro incerto
mentalizado no país dos raciocínios, sem a educação dos sentimentos - nossos verdadeiros
guias aqui no além.
A nossa situação aqui na vida espiritual é um resultado
natural de nossas ações, e não um plano recheado de sonhos fantasiosos do
cálculo. O que define nosso equilíbrio ou infelicidade é o estado íntimo que
carreamos nos domínios da consciência. Aliás, temos de convir que, na condição
de usurários milenares das benesses da vida, somos devedores de soma quase
insolvente.
Assim, o bem alheio, em nosso caso, é abatimento na
contabilidade de nossas contas espirituais, não constituindo ainda créditos polpudos
nos bancos da virtude.
Sem generalizações, costumamos amar muito o próximo e descuidarmos
do autoamor, do amor a si mesmo. Levam-se água e pão ao próximo e fica-se,
bastas vezes, à míngua dos alimentos essenciais. A proposta do amor não é
martirizar-se pelo bem alheio para conseguir a felicidade pessoal. A caridade é
um processo relacional, interativo, de crescimento mútuo. Ela tem de ser boa,
agradável e espontânea para quem faz e quem recebe, nivelando ambos no ato de
dar e receber, descaracterizando os papéis de doador e carente, porque carente
e doador somos todos, dependendo do que se passa durante o magno intercâmbio
solidário das relações.
Irmã Rosália alerta-nos para o ponto crucial da caridade
moral: "A caridade moral consiste em se suportarem umas às outras as
criaturas (...)"
Estudemos o sentido dessa fala, que nos descortinará um
mundo de percepções sobre a cidadania nos sentimentos.
Caridade é um aprendizado de profundas lições que, pouco
a pouco, lograremos no carreiro do crescimento pessoal, na convivência, dia
após dia, estejamos onde estivermos, fora e dentro do corpo físico, na vida
estuante do Amor de Nosso Pai em busca da cidadania cósmica, da qual todos
fazemos parte, ainda que sem consciência dessa condição gloriosa.
Livro: Prazer de Viver - Ermance Dufaux – Wanderley S. Oliveira
NO CAMINHO DO AMOR
Em Jerusalém, nos arredores do Templo, adornada mulher encontrou
um nazareno, de olhos fascinantes e lúcidos, de cabelos delicados e melancólicos
sorriso, e fixou-o estranhamente.
Arrebatada na onda de simpatia a irradiar-se dele,
corrigiu as dobras da túnica muito alva; colocou no olhar indizível expressão
de doçura e, deixando perceber, nos meneios do corpo frágil, a visível paixão
que a possuíra de súbito, abeirou-se do desconhecido e falou, ciciante:
-Jovem, as flores de Séforis encheram-me a ânfora do
coração com deliciosos perfumes.
Tenho felicidade ao teu dispor, em minha loja de
essências finas...
Indicou extensa vila, cercada de rosas, à sombra de
arvoredo acolhedor, e ajuntou:
-Inúmeros peregrinos cansados me buscam a procura do repouso
que reconforta. Em minha primavera juvenil, encontram o prazer que representa a
coroa da vida. E' que o lírio do vale não tem a carícia dos meus braços e a
romã saborosa não possui o mel de meus lábios.
Vem e vê! Dar-te-ei leito macio, tapetes dourados e vinho
capitoso ... Acariciar-te-ei a fronte abatida e curar-te-ei o cansaço da viagem
longa! Descansarás teus pés em água de nardo e ouvirás, feliz, as harpas e os
alaúdes de meu jardim. Tenho a meu serviço músicos e dançarinas, exercitados em
palácios ilustres!...
Ante a incompreensível mudez do viajor, tornou, súplice,
depois de leve pausa:
-Jovem, porque não respondes? Descobri em teus olhos diferentes
chama e assim procedo por amar-te. Tenho sede de afeição que me complete a
vida. Atende! Atende!...
Ele parecia não perceber a vibração febril com que
semelhantes palavras eram pronunciadas e, notando-lhe a expressão fisionômica
indefinível, a vendedora de essências acrescentou uma tanto agastada:
-Não virás?
Constrangido por aquele olhar esfogueado, o forasteiro
apenas murmurou:
-Agora, não. Depois, no entanto, quem sabe?!...
A mulher, ajaezada de enfeites, sentindo-se desprezada,
prorrompeu em sarcasmos e partiu.
Transcorridos dois anos, quando Jesus levantava paralítico,
ao pé do Tanque de Betesda, venerável anciã pediu-lhe socorro para infeliz
criatura, atenazada de sofrimento.
O Mestre seguiu-a, sem hesitar.
Num pardieiro denegrido, um corpo chagado exalava gemido
angustioso.
A disputada marcadora de aromas ali se encontrava
carcomida de úlceras, de pele enegrecida e rosto disforme. Feridas
sanguinolentas pontilhavam-lhe a carne, agora semelhante ao esterco da terra.
Exceção dos olhos profundos e indagadores, nada mais lhe restava da
feminilidade antiga. Era uma sombra leprosa, de que ninguém ousava aproximar.
Fitou o Mestre e reconheceu-o.
Era o mesmo mancebo nazareno, de porte sublime e atraente
expressão.
O Cristo estendeu-lhe os braços, tocados de intraduzível
ternura e convidou:
-Vem a mim, tu que sofres! Na Casa de Meu Pai, nunca se
extingue a esperança.
A interpelada quis recuar, conturbada de assombro, mas não
conseguiu mover os próprios dedos, vencida de dor.
O Mestre, porém, transbordando compaixão, prosternou-se
fraternal, e conchegou-a, de manso...
A infeliz reuniu todas as forças que lhe sobravam e
perguntou, em voz reticenciosa e dorida
-Tu?... O Messias nazareno?... O Profeta que cura,
reanima e alivia?!... Que vieste fazer, junto de mulher tão miserável quanto
eu?
Ele, contudo, sorriu benevolente, retrucando apenas:
-Agora, venho satisfazer-te os apelos.
E, recordando-lhe a palavra do primeiro encontro,
acentuou, compassivo:
-Descubro em teus olhos diferentes chama e assim procedo
por amar-te
Livro: Contos E Apólogos – Humberto De Campos – Irmão X
A POBREZA FELIZ
Emmanuel
Quem se empobrece de ambições inferiores, adquire a luz
que nasce da sede de perfeição espiritual.
Quem se empobrece de orgulho, encontra a fonte oculta da
humildade vitoriosa.
Quem s empobrece de exigências da vida física, recebe os
tesouros inapreciáveis da alma.
Quem se empobrece de aflições inúteis, em torno das
posses efêmeras da Terra, surpreende a riqueza da paz em si mesmo.
Quem se empobrece de vaidade, amealha as bênçãos do
serviço.
Quem se empobrece de ignorância, ilumina-se com a chama
da sabedoria.
Não vale amontoar ilusões que nos enganam somente no
transcurso de um dia.
Não vale sermos ricos de mentira, no dia de hoje, para
sermos indigentes da verdade, no dia de amanhã.
Ser grande, à frente dos homens, é sempre fácil. A
astúcia consegue semelhante fantasia sem qualquer obstáculo.
Mas ser pequenino, diante das criaturas, para servirmos
realmente aos interesses do Senhor, junto da Humanidade, é trabalho de raros.
Bem aventurada será sempre a pobreza que sabe se
enriquecer de luz para a imortalidade, porque o rico ocioso da Terra é o
indigente da Vida Mais Alta e o pobre esclarecido do mundo é o espírito
enobrecido das Esferas Superiores, que será aproveitado na extensão da Obra de
Deus.
Livro: DINHEIRO - Francisco Cândido Xavier – por Emmanuel
VOCÊ E OS OUTROS
Cap. XXIII – Item 5 (do Evangelho Segundo o Espiritismo)
Se teus pais não procuram a intimidade do Cristo,
renuncia à felicidade de vê-los comungar contigo o divino banquete da Boa Nova,
e ajuda teus pais.
Se teus filhos permanecem distantes do Evangelho,
renuncia ao contentamento de sentir-lhes o coração com o teu coração na senda
redentora, e ajuda teus filhos.
Se teus amigos não conseguem, ainda, perceber o amor de
Jesus, renuncia à ventura de guardá-los no calor de tua alma, ante o Sol da
Verdade, e ajuda teus amigos.
Renúncia com Jesus não quer dizer deserção. Expressa
devotamento maior.
Nele mesmo, o Senhor, vamos encontrar o sublime exemplo.
Esquecido de muitos e por muitos relegados às agonias da
negação, nem por isso se afastou dos companheiros que lhe deram as angústias do
amor-não-amado.
Ressurgindo da cruz, Ele, que atravessara sozinho os
pesadelos da ingratidão e as torturas da morte, volta ao convívio deles e lhes
diz confiante:
"- Eis que estarei convosco, até o fim dos séculos."
Emmanuel - Do Livro O Espírito da Verdade. Psicografia de
Francisco Cândido Xavier.
INDIVIDUAÇÃO OU
INDIVIDUALISMO?
"Apenas, Deus, em sua misericórdia infinita, vos pôs
no fundo do coração uma sentinela vigilante, que se chama consciência.
Escutai-a, que somente bons conselhos ela vos dará." O Evangelho Segundo o
Espiritismo - capítulo XIII - item 10
O que é certo e errado perante a "crise das
certezas" que domina a humanidade? Quais são as bússolas para nortear a
conduta neste cenário de transformações céleres por que passam as sociedades?
A palavra conceito quer dizer idéia que temos de algo ou
alguém. Analisamos a vida e os fatos pela ótica individual de nossas
conceituações. Nosso entendimento não ultrapassa esse limite.
Alguns desses conceitos resultam da vivência. Foram
estruturados pelo uso de todos os nossos sentidos, adquirindo significados.
Chamamo-los experiência. Outros são fruto da capacidade de pensar e adquirir
conhecimento. Determinam os pensamentos predominantes na vida mental. Quando
criamos fixação emocional a esse padrão do pensar, nasce o preconceito.
A experiência leva ao discernimento. O discernimento é a
porta para a compreensão. A compreensão identifica a Verdade.
O preconceito conduz ao julgamento. O julgamento sustenta
os rótulos. Os rótulos distanciam da realidade.
A atitude construtiva na Obra da Criação depende da
habilidade de relativizar. Até mesmo a experiência, por mais preciosa,
necessita ser continuamente repensada, evitando a estagnação em clichês.
A vida é regida pela Suprema Lei da Impermanencia. Certo
e errado são critérios sociais mutáveis sob a perspectiva sistêmica. Apesar
disso, são referências úteis à maioria dos habitantes da Terra.
Funcionam como "estacas disciplinadoras".
Porém, em certa etapa do amadurecimento espiritual, constituem amarras
psicológicas na descoberta da realidade pessoal, cuja riqueza está nos
significados únicos construídos a partir dos ditames conscienciais.
O Doutor Carl Gustav Jung chamou de individuação o
processo paulatino de expressar nossa singularidade, isto é, a "Marca de
Deus" em nós; o ato de talhar a individualidade, aquele ser distinto e
único que está latente dentro de nós.
Na individuação o critério certo/errado é substituído por
algumas perguntas: convém ou não? Quero ou não quero? Serve ou não serve?
Necessito ou não necessito? Questões cujas respostas vêm do coração. Somente
aprendendo a linguagem dos sentimentos poderemos escutar as mensagens da alma destinadas
ao ato de individuar-se. E sentimento é valor moral aferível exclusivamente por
nós mesmos no átrio sagrado da intimidade consciencial.
Somos aquilo que sentimos. As máscaras não destroem essa
realidade. Quando aprendemos o auto-amor, abandonamos o "crítico
interno" que existe em nós e passamos a exercer a generosidade do
autoperdão, ou seja, a aceitação incondicional da criatura ainda imperfeita que
somos. Nossa integração com a Verdade depende do conhecimento dessa realidade
particular: escutar a alma! Ela se manifesta na consciência cujos sentimentos
constituem o espelho. Através das sensações, no seu sentido mais amplo, a alma
se manifesta.
Escutando a alma, conectados à sua sabedoria interior,
desligamos dos padrões, normas, ambientes, pessoas e filosofias contrárias à
nossa felicidade e inadequadas ao caminho particular de aprimoramento.
Saber o que nos convém, saber o que é útil exige dilatado
discernimento aliado ao tempo. Quando usamos os rótulos certo/errado,
fomentamos a culpa e a punição. Quando sabemos o que nos convém, agimos e
escolhemos com responsabilidade na condição de autores do nosso destino. Quando
amadurecemos, percebemos que certo e errado se tornam formas de entender,
experiências diversificadas.
O caminho de ascensão para todos nós, Filhos de Deus, é o
mesmo, apenas muda a maneira de caminhar. Cada criatura tem seu passo, seu
ritmo, sua história.
Refletindo sobre conceitos, teçamos algumas ilações para
que não nos confundamos: grande distância separa o processo de individuação da
atitude de individualismo.
Na individuação encontramos a necessidade, enquanto no
individualismo temos a prevalência do interesse pessoal.
Na individuação temos a alma; no individualismo, a
personalidade.
Na individuação temos a consciência; no individualismo, o
ego.
Na individuação existem descoberta e criatividade; no
individualismo, a imitação e a disputa.
Na individuação temos o preparo e o amadurecimento; no individualismo,
a precipitação.
Na individuação experimentamos a realização pessoal; no
individualismo, a insaciedade.
A individuação é fruto do amor; o individualismo é a leira
do egoísmo.
Na individuação floresce o crescimento espiritual; o
individualismo é a sementeira do egoísmo.
O individualista, queira ou não, também caminha em seu
processo de individuação. Evidentemente, com menos consciência de suas reais
necessidades, permitindo larga soma de interesses particularistas.
Sabendo que todos rumam para o melhor, Jesus, em Sua excelsa
sapiência, estabeleceu: "Vós julgais segundo a carne, eu a ninguém
julgo." João, 8:15.
Se Ele, que podia, não julgou, por que nós, que dEle
seguimos os ensinos, vamos agir como quem pode escutar os alvitres da alma
alheia na tentativa de definir o que é certo ou errado?
Qual de nós estará em condição de nutrir certeza se a
atitude do próximo é uma expressão de individuação ou um cativeiro de
personalismo?
Livro: Escutando Sentimentos - Ermance Dufaux - Wanderley
S. Oliveira
SENSIBILIDADE
MEDIÚNICA
"Apenas Deus, em sua misericórdia infinita, vos pôs
no fundo do coração uma sentinela vigilante, que se chama consciência.
Escutai-a, que somente bons conselhos ela vos dará. Às vezes, conseguis
entorpecê-la, opondo-lhe o espírito do mal. Ela, então se cala. Mas ficai
certos de que a pobre escorraçada se fará ouvir, logo que lhe deixardes
aperceber-se da sombra do remorso. Ouvi-a, interrogai-a e com frequência vos
achareis consolados com o conselho que dela houverdes recebido."Um
Espírito Protetor, O ESE, capítulo XIII, ítem 10.
Retornar ao corpo físico é assinar um
"contrato" de responsabilidade individual ante o tribunal da
consciência, que exara apelos de melhoria contínua. É o objetivo maior de nosso
retorno à escola terrena.
Desde o estágio nas faixas da evolução vegetal, o ser
inteligente desperta para a sensibilidade preparando, paulatinamente, a
conquista dos cinco sentidos humanos na percepção e interação com a criação.
Agora, nas faixas da humanização, a criatura é convocada a inadiável
compromisso na expansão da sensibilidade, para escalar os seus infinitos
potenciais na esteira dos sentimentos.
Imperioso educar-nos para ouvir nossa consciência pela
leitura das emoções - espelho vivo dos alvitres da intimidade profunda.
Sensibilidade é aprender a sentir, antes de tudo, a natureza das forças
excelsas nas profundezas do reino íntimo. O contato com essa
"parcela-luz" dilata e eleva nossas percepções para o mundo objetivo.
Pascal afirma:
"Estejam sempre as vossas ações de harmonia com a
vossa consciência, e tereis nisso um meio certo de centuplicardes a vossa
felicidade nessa vida passageira e de preparardes para vós mesmos uma
existência mil vezes ainda mais suave".2828. O livro dos médiuns, capítulo
XXXI, dissertação XIII.
A arte de escutar os apelos da consciência estabelece uma
identificação com o Self, liberando o potencial criativo da mente, conectando-a
com as correntes energéticas da Suprema Verdade. Semelhante operação da vida
interior é dinamizada no sagrado terreno dos sentimentos, promovendo o homem à
condição de legatário legítimo da Herança Paternal.
Pulsando em sintonia afetiva com a Verdade, deciframos os
"códigos ocultos" daquilo que nos cerca a marcha evolutiva. Assim, habilitamo-nos
a compreender melhor a vida, passando a agir e reagir alicerçados em uma visão
rica de serenidade. Tornamo-nos "senhores de si".
Os médiuns usufruem a sensibilidade-empréstimo que os
capacita a ser decifradores da vida nas suas mais variadas formas de
manifestações. Como canais de sensitividade ampliada, encontram na faculdade
mediúnica uma ponte entre a personalidade eivada de ilusões e a consciência.
Entre o que se pensa ser e entre o que se é realmente. Mediunidade, portanto, é
o bisturi eficiente para dilacerar as carapaças das ilusões - grilhões da
mentira aduladora do orgulho. A mediunidade, antes de dilatar a sensibilidade
para fora, dilata-a para a intimidade, constrangendo docemente os medianeiros a
sentir com mais honestidade suas irradiações subconscientes, ou ainda
compelindo-os a descobrir os exuberantes tesouros na arca de sua
super-consciência.
Quaisquer intercâmbios de idéias são antecedidos por
complexo processo nas engrenagens do coração. O processamento da idéia passa
antes por uma decodificação afetiva. É nesse campo da vida mental que os
trabalhadores da mediunidade necessitam desenvolver melhores habilidades.
O trecho da codificação acima diz:
"Às vezes, conseguis entorpecê-la, opondo-lhe o
espírito do mal. Ela, então, se cala. Mas ficai certos de que a pobre
escorraçada se fará ouvir, logo que lhe deixardes aperceber-se da sombra do
remorso".
Como somos capazes de entorpecer a consciência? Que
mecanismo pode calá-la? Como e quando é gerado o remorso?
Quanta investigação a fazer sobre a vida interior!
Sensibilidade será fruto de aprendizagem ou de maturidade espiritual?
O médium que melhor interpretar seus sentimentos e
educá-los terá maiores possibilidades de recolher as idéias dos Bons Espíritos.
Educar a mediunidade é expandir os núcleos sensíveis do
ser interior, aprendendo a sentir a vida em sintonia com Deus, com o próximo e
a sua natureza singular.
Se o século XX foi a Era da Inteligência, o século XXI
será o tempo da intuição livre, consagrando a arte de sentir como o sexto
sentido do homem.
Sentimento é mediunidade. Sensibilidade é a base da vida
afetiva saudável.
O médium que melhor interpretar seus sentimentos e
educá-los terá maiores possibilidades de recolher as idéias dos Bons Espíritos.
Educar a mediunidade é expandir os núcleos sensíveis do
ser interior, aprendendo a sentir a vida em sintonia com Deus, com o próximo e
a sua natureza singular.
Livro: Prazer de Viver - Ermance Dufaux – Wanderley S. Oliveira
EXCESSO E VOCÊ
Amigo, Espiritismo é caridade em movimento.
Não converta o próprio lar em museu.
Utensílio inútil em casa será utilidade na casa alheia.
O desapego começa das pequeninas coisas, e o objeto
conservado, sem aplicação no recesso da moradia, explora os sentimentos do
morador.
A verdadeira morte começa na estagnação.
Quem faz circular os empréstimos de Deus, renova o
próprio caminho.
Transfigure os apetrechos, que lhes sejam inúteis, em
forças vivas do bem.
Retirem da despensa os gêneros alimentícios, que
descansam esquecidos, para a distribuição fraterna aos companheiros de estômago
atormentado.
Reviste o guarda-roupa, libertando os cabides das vestes
que você não usa, conduzindo-as aos viajares desnudos da estrada.
Estenda os pares de sapatos, que lhes sobram, aos pés
descalços que transitam em derredor.
Elimine do mobiliário as peças excedentes, aumentando a
alegria das habitações menos felizes.
Revolva os guardados em gavetas ou porões, dando
aplicação aos objetos parados de seu uso pessoal.
Transformem em patrimônio alheio os livros empoeirados
que você não consulta, endereçando-os ao leitor sem recursos.
Examine a bolsa, dando um pouco mais que os simples
compromissos da fraternidade, mostrando gratidão pelos acréscimos da Divina
Misericórdia que você recebe.
Ofereça ao irmão comum alguma relíquia ou lembrança
afetiva de parentes e amigos, ora na Pátria Espiritual, enviando aos que
partiram maior contentamento com tal gesto.
Renovemos a vida constantemente, cada ano, cada mês, cada
dia...
Previna-se hoje contra o remorso amanhã.
O excesso de nossa vida cria a necessidade do semelhante.
Ajude a casa de assistência coletiva.
Divulgue o livro nobre.
Medique os enfermos.
Aplaque a fome alheia.
Enxugue lágrimas.
Socorra feridas.
Quando buscamos a intimidade do Senhor, os valores
mumificados em nossas mãos ressurgem nas mãos dos outros, em exaltação de amor
e luz para todas as criaturas de Deus.
André Luiz - Livro: O Espírito da Verdade- Psicografia
Francisco C. Xavier e Waldo Vieira- Espíritos Diversos
JESUS EM AÇÃO
Irmãos surgem que, de vez em vez, se afirmam contra a
beneficência, alegando que enquanto nos consagramos ao socorro material
esquecemos os nossos deveres na iluminação do espírito. E enfileiram
justificativas às quais a Doutrina Espírita, revivendo os ensinamentos de
Jesus, opõe naturais contraditas.
Senão vejamos:
A Assistência social, no fundo, deve pertencer ao poder
público.
Indiscutivelmente, ninguém nega isso, mas se estamos na
praia, vendo companheiros que se afogam, como recusar cooperação ao serviço de
salvamento, quando estamos aptos a nadar?
Não adianta dar migalhas aos irmãos em penúria, cujas
necessidades são gigantescas.
Consideremos, porém, que se não começarmos as boas obras,
com o pouco de nossas possibilidades reduzidas, nunca aprenderemos a
desligar-nos do muito para colaborar a benefício dos outros.
Desaconselhável auxiliar criaturas viciadas com o que
apenas conseguiríamos conservá-las em perturbação e desequilíbrio.
Quem de nós poderá medir a própria resistência, ante as
provações do caminho e de que modo apreciaríamos a conduta do próximo para
conosco, se fôssemos nós os caídos em tentação?
Muitos dos chamados pedintes mostram mais necessidade de
trabalho que de auxílio.
Claramente justa a alegação, mas muito raramente quem diz
isso demonstra a disposição ou a possibilidade de ser o empregador.
Devemos cogitar exclusivamente do ensino moral, de
maneira a cumprir as tarefas de orientação que o Espiritismo nos preceitua.
Sem dúvida, é obrigação nossa colaborar, acima de tudo, a
obra educativa do espírito eterno, mas é importante lembrar que o próprio
Cristo se empenhou a alimentar a multidão faminta, ao ministrar-lhe as Boas
Novas de Salvação, de vez que não há cabeça tranquila sobre estômago
atormentado.
Compreendemos isso e, quanto nos seja possível, entreguemo-nos
à escola do amparo fraterno, com todas as nossas forças, reconhecendo que
estamos cada vez mais necessitados de caridade, em todos os sentidos, de uns
para com os outros, a fim de revelarmos que o Espiritismo é realmente Jesus em
ação.
Livro: Doutrina De Luz - Francisco Cândido Xavier
NA HORA DA ASSISTÊNCIA
“Mas quando fizeres convite, chama os pobres, aleijados,
coxos e cegos.” Jesus (Lucas, 14: 13)
“Auxiliai os infelizes o melhor que puderdes.” (cap. 13,
Item 9)
Nas obras de assistência aos irmãos que nos felicitam com
as oportunidades do serviço fraterno, em nome do Senhor, vale salientar a autoridade amorosa do Cristo que no-los
recomendou.
Ao recebê-los à porta, intentemos ofertar-lhes algumas
frases de conforto e bom ânimo, sem ferir-lhes o coração, ainda mesmo quando
não lhes possamos ser úteis.
Visitando-lhes o lar, diligenciemos respirar-lhes o
ambiente doméstico, afetuosamente, reconhecendo-nos, na intimidade da própria
família, que nos merece respeito natural e cooperação espontânea, sem tragos de
censura.
Em lhes servindo à mesa, fujamos de reprovar-lhes os
modos ou expressões, diferentes dos nossos, calando apontamentos deselegantes e
manifestações de azedume, o que lhes agravaria a subalternidade e a desventura.
Socorrendo-lhes o corpo enfermo ou dolorido, reflitamos nos seres que nos são particularmente
amados e imaginemos a gratidão de que seríamos possuídos, diante daqueles que
os amparassem nos constrangimentos orgânicos.
Se aceitamos a incumbência de prová-los nas filas
organizadas para a distribuição de favores diminutos, preservemos o regulamento
estabelecido, com lhaneza e bondade, sem fomentar impaciência ou tumulto; e, se
alguns deles, depois de atendidos, voltarem a nova solicitação, recordemos os
filhos queridos, quando nos pedem repetição do prato, e procuremos
satisfazê-los, dentro das possibilidades em mão, sem desmerecê-los com qualquer
reprimenda.
Na ocasião em que estivermos reunidos, em equipes de
trabalho, a fim de supri-los, estejamos de bom humor, resguardando a disciplina
sem intolerância e cultivando a
generosidade sem relaxamento, na convicção de que, usando a gentileza, no veículo
da ordem, é sempre possível situar os tarefeiros do bem, no lugar próprio, sem desperdiçar-lhes o concurso
valioso.
Nós que sabemos acatar com apreço e solicitude a todos os
representantes dos poderes transitórios do mundo e que treinamos boas maneiras
para comportamento digno nos salões aristocráticos da Terra, saibamos também
ser
afáveis e amigos, junto dos nossos companheiros em
dificuldades maiores.
Eles não são apenas nossos irmãos.
São convidados de Cristo, em nossa casa, pelos quais
encontramos ensejo de demonstrar carinho
e consideração para com Ele o Divino Mestre, em pequeninos, gestos de amor.
LIVRO DA ESPERANÇA (pelo Espírito Emmanuel) FCX
O BENDITO AGUILHÃO
Atendendo a certas
interrogações de Simão Pedro, no singelo agrupamento apostólico de Cafarnaum,
Jesus explicava solícito:
-Destina-se a
Boa-Nova, sobretudo, à vitória da fraternidade. Nosso Pai espera que os povos
do mundo se aproximem uns dos outros e que a maldade seja esquecida para
sempre.
Não é justo
combatam as criaturas reciprocamente, a pretexto de exercerem domínio indébito sobre
os patrimônios da vida, dos quais somos todos simples usufrutuários.
Operemos, assim,
contra a inveja que ateia o incêndio da cobiça, contra a vaidade que improvisa
a loucura e contra o egoísmo que isola as almas entre si....
Naturalmente, a
grande transformação não surgirá do inesperado.
Santifiquemos o
verbo que antecipa a realização.
No pensamento bem
conduzido e na prece fervorosa, receberemos as energias imprescindíveis à ação
que nos cabe desenvolver.
A paciência no
ensino garantirá êxito à sementeira, a esperança fiel alcançará o Reino divino,
e a nossa palavra, aliada ao amor que auxilia, estabelecerá o império da
infinita Bondade sobre o mundo inteiro.
Há sombras e
moléstias por toda a parte, como se a existência na Terra fosse uma corrente de
águas viciadas. É imperioso reconhecer, porém, que, se regenerarmos a fonte,
aparece adequada solução ao grande problema.
Restaurado o
espírito, em suas linhas de pureza, sublimam-se-lhe as manifestações.
Em face da pausa
natural que se fizera, espontânea, na exposição do Mestre, Pedro interferiu, perguntando:
-Senhor, as tuas
afirmativas são sempre imagens da verdade. Compreendo que o ensino da Boa Nova
estenderá a felicidade sobre toda a Terra... No entanto, não concordas que as enfermidades
são terríveis flagelos para a criatura? E se curássemos todas as doenças? Se proporcionássemos
duradouro alívio a quantos padecem aflições do corpo? Não acreditas que, assim
instalaríamos bases mais seguras ao Reino de Deus?
E Filipe, ajuntou
algo tímido?
-Grande realidade!...
Não é fácil concentrar ideias no Alto, quando o sofrimento físico nos incomoda.
É quase impossível
meditar nos problemas da alma, se a carne permanece abatida de achaques...
Outros
companheiros se exprimiram, apoiando o plano de proteção integral aos
sofredores.
Jesus deixou que a
serenidade reinasse de novo, e, louvando a piedade, comunicou aos amigos que,
no dia imediato, a título de experiência, todos os enfermos seriam curados,
antes da pregação.
Com efeito, no
outro dia, desde manhãzinha, o Médico Celeste, acolitado pelos apóstolos, impôs
suas milagrosas mãos sobre os doentes de todos os matizes.
No curso de
algumas horas, foram libertados mais de cem prisioneiros da sarna, do cancro,
do reumatismo, da paralisia, da cegueira, da obsessão...
Os enfermos
penetravam o gabinete improvisado ao ar livre, com manifesta expressão de abatimento,
e voltavam jubilosos.
Tão logo
reapareciam, de olhar fulgurante, restituídos à alegria, à tranquilidade e ao
movimento, formulava Pedro o convite fraterno para o banquete da verdade e luz.
O Mestre, em
breves instantes, falaria com respeito à beleza da Eternidade e à glória do
Infinito; demonstraria o amor e a sabedoria do Pai e descortinaria horizontes
divinos da renovação, desvendando segredos do Céu para que o povo traçasse
luminoso caminho de elevação e aperfeiçoamento na Terra.
Os alegres
beneficiados, contudo, se afastavam céleres, entre frases apressadas de agradecimento
e desculpa. Declaravam-se alguns ansiosamente esperados no ambiente doméstico e
outros se afirmavam interessados em retomar certas ocupações vulgares, com urgência.
Com a cura da
última feridenta, a vasta margem do lago contava apenas com a presença do Senhor
e dos doze aprendizes.
Desagradável
silêncio baixou sobre a reduzida assembleia.
O pescador de
Cafarnaum endereçou significativo olhar de tristeza e desapontamento ao Mestre,
mas o Cristo falou compassivo:
-Pedro, estuda a
experiência e aguarda a lição. Aliviemos a dor, mas não nos esqueçamos de que o
sofrimento é criação do próprio homem, ajudando-o a esclarecer-se para a vida
mais alta.
E sorrindo,
expressivamente, rematou:
-A carne enfermiça
é remédio salvador para o espírito envenenado. Se o bendito aguilhão da enfermidade
corporal é quase impossível tanger o rebanho humano do lodaçal da Terra para as
culminâncias do Paraíso.
Livro: Contos E Apólogos – Humberto De Campos – Irmão X
A CARIDADE DESCONHECIDA
A conversação em casa de Pedro versava, nessa noite,
sobre a prática do bem, com a viva colaboração verbal de todos.
Como expressar a compaixão, sem dinheiro? Por que meios
incentivar a beneficência, sem recursos monetários? Com essas interrogativas,
grandes nomes da fortuna material eram invocados e a maioria inclinava-se a
admitir que somente os poderosos da Terra se encontravam à altura de estimular
a piedade ativa, quando o Mestre interferiu, opinando, bondoso: — Um sincero
devoto da Lei foi exortado por determinações do Céu ao exercício da
beneficência; entretanto, vivia em pobreza extrema e não podia, de modo algum,
retirar a mínima parcela de seu salário para o socorro aos semelhantes.
Em verdade, dava de si mesmo, quanto possível, em boas
palavras e gestos pessoais de conforto e estímulo a quantos se achavam em
sofrimento e dificuldade; porém, magoava-lhe o coração a impossibilidade de
distribuir agasalho e pão com os andrajosos e famintos à margem de sua estrada.
Rodeado de filhinhos pequeninos, era escravo do lar que
lhe absorvia o suor.
Reconheceu, todavia, que, se lhe era vedado o esforço na
caridade pública, podia perfeitamente guerrear o mal, em todas as
circunstâncias de sua marcha pela Terra.
Assim é que passou a extinguir, com incessante atenção,
todos os pensamentos inferiores que lhe eram sugeridos; quando em contacto com
pessoas interessadas na maledicência, retraía- se, cortês, e, em respondendo a
alguma interpelação direta, recordava essa ou aquela pequena virtude da vítima
ausente; se alguém, diante dele, dava pasto à cólera fácil, considerava a ira
como enfermidade digna de tratamento e recolhia-se à quietude; insultos alheios
batiam-lhe no espírito à maneira de calhaus em barril de mel, porquanto, além
de não reagir, prosseguia tratando o ofensor com a fraternidade habitual; a
calúnia não encontrava acesso em sua alma, de vez que toda denúncia torpe se
perdia, inútil, em seu grande silêncio; reparando ameaças sobre a tranqüilidade
de alguém, tentava desfazer as nuvens da incompreensão, sem alarde, antes que
assumissem feição tempestuosa; se alguma sentença condenatória bailava em torno
do próximo, mobilizava, espontâneo, todas as possibilidades ao seu alcance na
defesa delicada e imperceptível; seu zelo contra a incursão e a extensão do mal
era tão fortemente minucioso que chegava a retirar detritos e pedras da via
pública, para que não oferecessem perigo aos transeuntes.
Adotando essas diretrizes, chegou ao termo da jornada
humana, incapaz de atender às sugestões da beneficência que o mundo conhece.
Jamais pudera estender uma tigela de sopa ou ofertar uma
pele de carneiro aos irmãos necessitados.
Nessa posição, a morte buscou-o ao tribunal divino, onde
o servidor humilde compareceu receoso e desalentado.
Temia o julgamento das autoridades celestes, quando, de
improviso, foi aureolado por brilhante diadema, e, porque indagasse, em
lágrimas, a razão do inesperado prêmio, foi informado de que a sublime
recompensa se referia à sua triunfante posição na guerra contra o mal, em que
se fizera valoroso empreiteiro.
Fixou o Mestre nos aprendizes o olhar percuciente e calmo
e concluiu, em tom amigo: — Distribuamos o pão e a cobertura, acendamos luz
para a ignorância e intensifiquemos a fraternidade aniquilando a discórdia, mas
não nos esqueçamos do combate metódico e sereno contra o mal, em esforço
diário, convictos de que, nessa batalha santificante, conquistaremos a divina
coroa da caridade desconhecida.
Neio Lúcio - Do Livro Jesus no Lar - Francisco C. Xavier
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